Um olhar de “amor profundo” a Cristo crucificado. O frade
menor o evocou na reflexão matutina, detendo-se sobre a morte do Messias
narrada no Evangelho segundo São Mateus. Uma morte “real”, não “aparente”,
esclareceu imediatamente o pregador franciscano.
“Não somente os discípulos têm dificuldade de acreditar que
tenha voltado à vida, e isso é verdade; mas isso é possível propriamente porque
morreu verdadeiramente.”
E os detalhes que descrevem a morte de Jesus são tão
“incômodos”, tão cruentos, como por exemplo o grito na Cruz, que fazem parte
daqueles que são habitualmente definidos “critérios de desconcerto”, que nos
levam a dizer que tais particulares não podem ter sido criadas: efetivamente,
foram escritas porque dizem realmente “algo daquilo que aconteceu”.
Em primeiro lugar, deve ser analisado “o sentido de abandono
que Jesus viveu na Cruz” – quando pronuncia: “Meu Deus, meu Deus, por que me
abandonastes” – agravado pela incompreensão “por parte de quem está assistindo
ao espetáculo cruento” da Paixão de Cristo.
Há quem acredite que Jesus estivesse chamando Elias,
explicou o franciscano repercorrendo os Evangélicos sinóticos:
“Quem podia ser Elias, que Jesus invocava? Claro, o profeta que
teria voltado: mas o que poderia ter feito? Fazê-lo descer da Cruz? Ou talvez,
como se dizia – e lemos nos Evangelhos –, Elias já tinha vindo e era o Batista?
Da Cruz, Jesus chamava talvez seu amigo? Evidentemente se trata de um grande
mal-entendido: Jesus não está pedindo ajuda a Elias e nem mesmo ao Batista;
Jesus está – com um grito – chamando o Pai. Mas o Pai silencia.”
Propriamente o fato de o Pai não intervir é “outro elemento
desconcertante de toda a narração da morte de Jesus”, explicou Pe. Michelini.
Em todo caso, o sentimento que Cristo está vivendo, o sentimento de abandono da
parte do Pai é algo real e tão “escandaloso” que resulta difícil ser inventado.
Jesus “se lamenta” não porque se sinta abandonado por Deus
ou pela dor, mas porque suas forças físicas “vacilam”. No entanto, dois
Evangelhos, o de João e o de Lucas, não trazem o grito de Cristo: é “por demais
escandaloso”, ressaltou o pregador dos Exercícios espirituais.
A “última tortura” para Jesus é que não seja compreendido
“nem mesmo estando na Cruz”: é “algo desconcertante”, é “incompreendido”, disse
Pe. Michelini.
Por que acaba sendo incompreendido? – perguntou-se o
pregador, recorrendo a uma experiência pessoal: o colóquio tido com um casal em
que a mulher através de mensagens no celular dele havia descoberto a traição do
marido.
Duas pessoas que carregavam consigo “uma grande ferida”, o
adultério: “no fundo, aquele era o problema que os impedia de compreender-se
reciprocamente”, disse o frade menor. Jesus, refletiu o pregador, quando pode,
intervém para “explicar e explicar novamente”. Mas da Cruz “não consegue
explicar mais nada”:
“Naturalmente, sabemos que a Cruz explica tudo. Mas Jesus não
pode nem mesmo mais dizer porque está chamando o Pai e não está chamando Elias.
Pode fazer somente uma coisa: confiar-se ao Espírito que efetivamente doará,
para que seja o Espírito a explicar aquilo que não tinha conseguido fazer
entender. Ou então, terá que esperar ressurgir e estar com seus discípulos,
deter-se com eles à mesa durante 40 dias –diz o início dos Atos dos Apóstolos –
para acompanhar os discípulos segurando-os pelas mãos, eles que não entendem.”
Em seguida, o pregador dos Exercícios espirituais recordou
que “além” desta última tortura, há também a “lança do centurião”. E repropôs o
episódio de Cafarnaum: outro centurião “provavelmente armado” se dirige a Jesus
porque mortificado com a enfermidade de um “filho” ou um “servo” seu”. E Cristo
não lhe nega “um gesto de amor”:
“Ora, segundo algumas importantes testemunhas textuais de
Mateus, Cristo foi morto propriamente com o golpe da lança de um soldado. Jesus
ofereceu a outra face aos soldados, como havia ensinado no sermão da montanha:
havia dado sua disponibilidade ao centurião de Cafarnaum. Agora, da Cruz, podia
somente oferecer seu lado do qual brotará água e sangue, para o perdão dos
pecados.”
Em seguida, examinou a passagem do Evangelho segundo São
Mateus que explica que o golpe de lança foi dado “antes” da morte de Jesus e
não depois, como no Evangelho segundo São João. Embora – observou o pregador –
tenha acabado por prevalecer na Igreja a interpretação do quarto Evangelho: o
golpe de lança “após” a morte do Senhor.
Por fim, a meditação deteve-se sobre as mulheres presentes
na cena da crucifixão. Segundo Mateus, são “muitas”, entre as quais Maria “mãe
de Tiago e José”; para alguns essa figura é a “Mãe do Senhor”, que está
presente “aos pés da Cruz” como no Evangelho segundo São João:
“Talvez também aqui, como alguns notaram, o evangelista Mateus –
que poderia até mesmo ter inspirado João – queira dizer que Ela está presente,
mas num modo muito oblíquo, até mesmo com um realce, uma estratégia retórica
não chamando-a ‘a Mãe do Senhor’, mas ‘Maria, a mãe de Tiago e de José’. Por
qual motivo? Alguém escreveu – é uma hipótese interessante – que Maria, a Mãe
de Jesus, não é mais simplesmente Ela e Jesus, não é mais simplesmente o Filho
e Maria. Como depois Maria, no Evangelho segundo São João, não será mais
simplesmente a Mãe de Jesus, mas a Mãe do discípulo amado e, portanto, Mãe da
Igreja. Do mesmo modo Maria, na Paixão narrada por São Mateus, está presente e
seria, porém, a mãe de Tiago e de José, isto é, de seus irmãos: e, por
conseguinte, também para nós, para este Evangelho, a Mãe da Igreja.”
Por fim, o pregador dos Exercícios espirituais convidou a
perguntar-se se, devido a “fechamentos” ou por orgulho, não se entendem os
outros, não tanto porque as coisas que dizem “são pouco claras”, mas
simplesmente porque “não querem compreender”.
Em seguida, pediu que se busque compreender se existe um
“defeito” na comunicação com os outros, exortando a “melhorá-la”, crescendo “na
humildade”, e a perguntar-se se se consegue “colher a presença de Deus” também
no “ordinário do cotidiano” ou no “olhar do outro”.
- Exercícios
espirituais: morte de Jesus, verdadeira porque escandalosa - Quaresma
Fonte: Rádio Vaticano
Foto retirada da internet
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