O tema "aborto" não é simples, nem fácil de
enfrentar. Faz milhares de anos que deixou de ser brincadeira, se é que algum
dia o foi. De um lado estão milhões de mulheres que não querem ser mães do feto
concebido e que correm o risco de morrer se não o extraírem de maneira
higiênica; do outro estão os fetos que fatalmente morrerão com o beneplácito da
lei, a partir do momento que os políticos e seus partidos decidirem que
interrompê-los não será mais crime!
Como se pode perceber está longe, muito longe de ser apenas
assunto de saúde pública. Interromper um feto humano é mais do que questão de
assepsia. É sociologia, filosofia, teologia e ascese. Uma vida que se tornou
problema será eliminada antes da 10ª ou 14ª semana porque uma junta de
estudiosos decretou que ainda não são humanos. Ignora-se o que outra junta de
estudiosos e religiosos disse sobre o direito de nascer.
Um falacioso marketing decide carimbar como moderno quem
apoia sua extração e ultrapassada e mesozoica quem defende seu direito de vir a
ser pessoa. Defender a vida do feto tornou-se conservadorismo e defender a
grávida que não o quer é modernidade... Só que tem que adjetivos e apupos não
ajudam nem o feto nem a grávida. Nem ela é uma coitada, nem o feto é uma
excrescência. Ela que pensa, deve ser ouvida e aconselhada, por menos conselho
que aceite, e o feto, que não pensa nem pode pensar precisará de bons
advogados. Passar uma lei do tipo "agora pode" não resolve a questão
do ventre e da vida que ali se aninhou.
Não há como empurrar o assunto apenas para a esfera do
religioso, nem apenas para a esfera do político. Será sempre um tema religioso
e político porque se trata de interferir na saúde da grávida, na ascese e na
decisão de sofrer por esta vida nova ou interrompê-la porque trouxe problemas.
Não importa qual a definição de vida, de vida humana ou de
pessoa, o fato é que no ato do aborto o feto morre. Se for aborto espontâneo,
morre por não ter concluído seu curso. Se aborto provocado, morre porque
interromperam o seu curso.
Queiramos ou não, o ato de interromper um pequeníssimo ser
humano em formação atinge não fica apenas na esfera da saúde: mexe com o
sociológico, o filosófico, o teológico e o político. O sociológico porque terá
repercussões na sociedade; o filosófico porque forçosamente entramos na
conceituação de pessoa e coisa e de vida e morte; o teológico porque mexe com
religiosos e ateus na discussão da pertença do feto; o político porque alguém
vota e alguém assina que se pode eliminar uma vida e a partir de determinado
momento extrair um feto humano não será mais visto como crime!
A grávida que pressiona pelo direito de não ser mãe do feto
que gerou e quer fazê-lo sem risco de saúde pensa nos seus direitos políticos e
vitais. O feto, que não pode falar e cuja trajetória alguém deseja abortar, tem
nos religiosos e em alguns ateus filosoficamente a favor de toda e qualquer
vida a caminho, seus grandes defensores. Da mesma forma que os governos
oferecem defensoria pública para um pobre incapaz de se defender, deveria
oferecer defesa a um futuro cidadão que agora só tem o tamanho de uma unha, mas
que já está vivo. Ou um país só deve proteger suas crianças nascidas? Feto
ainda não é cria? Se o governo não o faz e diz que não o fará, cabe aos grupos
pró-feto e pró-vida do feto debater com os pró-grávida e por saúde da grávida
as consequências deste ato.
Quem tem direito a esta vida? Quem tem o direito de
interromper o seu curso? Pode-se destruir uma semente rara? Pode alguém
decretar que, de agora em diante, não será mais crime destruir mudinhas ou
sementes de peroba, de sequoia ou de ébano? Se há leis protegendo sementes e
mudas afrouxa-se a lei que protege os fetos?
É cidadania pensar na saúde das grávidas. Será cidadania
permitir a interrupção do feto? Que tipo de cidadania? Não estamos todos
brigando pela preservação da água, das florestas e da vida? E ao mesmo tempo
votamos uma lei que interrompe vidas humanas? Sob o argumento de que são apenas
um feto? E que filosofia disse que feto ainda não é filho que a grávida de um
feto ainda não é mãe?
Viu só como se pode ir longe na discussão? Avançado e
progressista por que e no quê? Retrógrado e ultrapassado por que e no quê?
Adjetivos não mudam a essência do ato. E o ato é um só: uma vida será
interrompida! Feita a escolha o governo, a mulher ou o casal decidem quem morre
e quem vive!
Deus? Pois é! Se ele existe ele tem algo a dizer sobre a
morte deste feto. Se não existe, existe um fenômeno chamado tempo-futuro que
acabará passando sua sentença. É que todo aborto é seguido de um depois! Não é
nem nunca será o mesmo plantar e arrancar um pé de açucena!
Texto: Pe. Zezinho, scj
Fonte: Edições Paulinas
Foto retirada da internet
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